COSTUMES BÍBLICOS: Interpretando a Bíblia através dos séculos


Interpretando a Bíblia através dos séculos

INTERPRETANDO A BÍBLIA
ATRAVÉS DOS SÉCULOS
Através dos séculos, na história da igreja, a Bíblia foi lida de maneiras diferentes. Algumas delas foram herdadas do judaísmo(a maneira correta de lê), mas muitas surgiram depois, geralmente sob a influência da obra missionária entre povos previamente pagãos.
Dois tipos principais de interpretação bíblica predominam.

  • O primeiro enfatiza o significado histórico-literário direto ou imediato do texto.
  • O segundo se concentra mais no seu significado espiritual. Ambos são conhecidos desde os tempos do Novo Testamento, embora sua importância relativa variado de tempos em tempos.
Nos primeiros séculos da igreja cristã, diferentes idéias e filosofias influenciaram a interpretação da Bíblia. A maior influência foi dos gregos, que resultou na produção dos credos, ainda hoje usados na igreja. Mas também foram introduzidas idéias (da alma, por exemplo) que afastaram a fé e a prática cristã das suas origens hebraicas. Orígenes (foto ao lado, nascido por volta de 185 d.C.) representava tanto a influência da filosofia grega sobre o pensamento cristão quanto o uso da alegoria como forma de entender o AT. 
Na Idade Média, a tradição "escolástica" construiu como que um edifício doutrinário sobre o fundamento dos credos, organizando o ensino cristão numa teologia "sistemática". A Bíblia acabou sendo reduzida a um conjunto de textos comprobatórios de doutrinas, tirados do contexto ou separados do seu significado original. Apesar do esforço dos Reformadores, a mesma tendência ressurgiu nas igrejas protestantes, quando a doutrina da igreja foi sobreposta aos textos bíblicos. 
Interpretação histórico-literária
Este é o tipo mais e se originou no judaísmo, que dava grande ênfase à ortografia e ao significado exato de cada palavra do Antigo Testamento. Os cristãos adotaram essa prática e a aplicaram à tradução grega do Antigo Testamento (a "Septuaginta") e ao Novo Testamento.
Os primeiros comentários cristãos
Muitos dos primeiros comentários consistem em grande parte de explicações de palavras incomuns, nomes bíblicos e assim por diante. Algumas dessas explicações estão corretas, mas muitas são irreais e imaginárias.
No século 4 da era cristã havia comentários sequenciados sobre o conteúdo dos textos bíblicos, especialmente dos Evangelhos e das cartas de Paulo. Uma escola, sediada em Antioquia, dedicava-se de forma especial a temas teológicos, por exemplo, provar a divindade de Cristo. Outra, que ficava na parte ocidental do Império Romano, onde se falava latim, preocupava-se mais em desenvolver as implicações sociais e éticas do ensinamento bíblico, e dava uma ênfase ao Antigo Testamento que era inusitada ou desconhecida em outros lugares, naquela época.
Declínio e renovação
Durante a Idade Média, este tipo de interpretação entrou em declínio, em boa parte porque poucas pessoas sabiam ler grego ou hebraico. Mas ela não desapareceu, e por muito tempo a igreja insistiu que sua doutrina devia ser baseada em afirmações claras das Escrituras. Isto ajudou a manter uma noção da importância do significado histórico-literário do texto na mente das pessoas e as incentivou a estudá-lo com mais cuidado.
A partir de 1200, aproximadamente, houve um ressurgimento do interesse pelo texto e alguns monges até aprenderam hebraico para poderem comentar o Antigo Testamento com mais precisão. O grande avivamento do estudo que ocorreu nos séculos 15 e 16 colocou essa abordagem em evidência outra vez.
Martinho Lutero (1483-1546) insistiu que este era o único método de interpretação confiável para transmitir a "Palavra de Deus" a nós, embora, na prática, ele nem sempre seguisse esse princípio e com ódio exagerado aos judeus alemãs, redigiu um texto que posteriormente foi usado pelo insano Hitler para assassinar milhões de judeus! Ou seja, ele contribui para o acontecimento do holocausto! leia mais AQUI
João Calvino (1509-1564) adotou as posições de Lutero e as sistematizou numa série de comentários que continuam sendo clássicos do gênero.
Calvino acreditava que um texto deve ser lido no seu contexto histórico e como uma narrativa interligada. Ele também deu grande ênfase ao significado real das palavras e censurou as tentativas de alterar isto simplesmente para ajudar a estabelecer este ou aquele ponto doutrinário ou teológico.
Interpretação "pactual"
Com base nessa convicção, desenvolveu-se um estudo bem mais profundo das partes históricas da Bíblia, que acabaria no que veio a ser conhecido como interpretação "pactual". Aqui a Bíblia é vista como registro histórico do relacionamento salvador de Deus com o seu povo, cristalizado na "aliança" ou "pacto" que Deus fez com eles. Este relacionamento cresceu e se desenvolveu com o passar do tempo, até ser cumprido em Cristo.
A interpretação pactual (ou aliancista) é uma maneira muito boa de demonstrar como o Antigo Testamento continua sendo a "Palavra de Deus". ("Testamento" NÃO é o mesmo que "aliança" tanto no hebraico quanto no grego.)

Leia: "NOVO TESTAMENTO OU NOVA ALIANÇA"

Qual é a diferença entre “Testamento” e “Aliança”? No mundo ocidental, muitas pessoas estão familiarizadas com uma “vontade final e testamento” – um documento legal lido quando alguém morre. O documento expressa os desejos do falecido, muitas vezes relacionados com bens e heranças. Como declaração unilateral de vontade, um “testamento”, nesse sentido, não é o mesmo que um “contrato” ou “pacto”, que exige um acordo entre duas ou mais partes. O autor de Hebreus faz um apelo a este termo grego para mostrar que um “testamento” (διαθήκη; diatheke ) é iniciado somente após a morte (Hb 9:16-17).
O termo teológico inglês “Novo Testamento” vem do latim Novum Testamentum – O latim para “Novo Testamento” traduz a frase grega καινὴ διαθήκη ( kaine diatheke ) que aparece na Septuaginta (Jr 31:31 LXX; cf. Lc 22:20 ). No entanto, após um exame mais detalhado, o termo hebraico original para “aliança” (בְּרִית; berit ) não se alinha exatamente com a ideia de “testamento” (διαθήκη; diatheke ). Então, por que essa palavra grega seria usada em Lucas, Hebreus e 1 Coríntios (Lc 22:20, Hb 8:8; 9:11-15, Cor 11:25)? Difícil dizer, mas talvez eles simplesmente seguiram os passos dos tradutores da Bíblia judaica para o grego, que sentiram que esta era a melhor palavra para traduzir a “aliança” hebraica (בְּרִית; berit). Mas as traduções são obra de autores humanos.
De fato, um “testamento” é bem diferente do termo inglês “pacto” – uma palavra que vem do latim convenire, que significa “unir-se”, “encontrar-se” ou “concordar”. Em hebraico, o conceito de “aliança” (בְּרִית; berit ) denota fazer um acordo ou tratado através da interação, na maioria das vezes “jantando juntos” (בָּרָה; barah ; cf. Gn 26:28-29; 31:51-54 ). Exceto por alguns casos bíblicos, os convênios geralmente incluem termos, condições e obrigações específicas para cada participante. O conceito teológico de um “Novo Testamento” vem de Jeremias 31:31-34, originalmente expresso em hebraico e somente posteriormente traduzido para o grego. Em última análise, todos os usos do termo grego nos escritos apostólicos originam-se da “nova aliança” de Jeremias (בְּרִית חֲדָשָׁה;berit hadashah ), embora os autores do primeiro século se baseassem na tradução da Bíblia grega (LXX).
Então, os leitores ingleses deveriam estar se referindo a um Novo Testamento ou Nova Aliança? Uma vez que não se pode entrar em um acordo mútuo unilateral, “Novo Testamento” seria um nome impróprio. Por outro lado, as alianças na Bíblia são feitas “com” e “entre” as partes (por exemplo, Gn 6:18, 9:17, 17:10; Dt 29:12; 1 Rs 8:21, 15:19; 2 Sm 23:5). Assim, o termo “aliança” é uma escolha muito mais precisa para expressar essa ideia bíblica.
As leis relativas a alimentos que aparecem em Levítico, por exemplo, foram dadas como parte da aliança que Deus fez com Israel através de Moisés. Mas quando Cristo veio, elas deixaram de ser relevantes e, assim, puderam ser descartadas.
Isto não significa que essas leis não tenham vindo de Deus. Mas, como as circunstâncias passaram a ser outras, fez-se necessária uma nova aplicação desse antigo ensinamento. Esta aplicação foi fornecida por Jesus, que reinterpretou a aliança de maneira radical.
Pensamento histórico-crítico
A interpretação histórica do tipo pactual continua a dominar o campo da teologia bíblica até o início do século 19, quando foi suplementada e parcialmente substituída pelo que hoje chamamos de pensamento "histórico-crítico".
Ele adota a ênfase histórica de Calvino, mas vê a Bíblia essencialmente como registro da comunidade da aliança e sua visão de Deus não como a revelação de Deus para ela. Esta abordagem detectou muitas opiniões teológicas diferentes na Bíblia, o que dificultou a tarefa de lê-la como unidade ou um só livro.
Interpretação canônica
Mais recentemente, houve uma reação contra este tipo de análise e uma nova proposta, "interpretação canônica", foi apresentada.
Ela concorda que a Bíblia pode ter várias fontes diferentes, mas diz que o que importa é o fato de que elas chegaram a nós como mensagem única num só livro. Portanto, o que une a Bíblia é mais importante que aquilo que nos lembra das origens diversas de parte do material que ela contém.
No mundo moderno pode-se dizer que quase todos os intérpretes da Bíblia inseridos no contexto acadêmico adotam uma forma de interpretação histórico-literária, e que a maioria deles pode ser classificada como "críticos históricos".
Significado espiritual
Sempre existiram aqueles que achavam que a Bíblia não é uma mensagem direta de Deus, mas um enigma que deve ser decifrado, geralmente de forma altamente complexa e misteriosa.
Um código secreto de números?
Por exemplo, no hebraico e no grego cada letra representa também um número, e, em função disso, surgiram teorias segundo as quais a Bíblia seria um código numérico secreto.
A numerologia, que é como se chama isso, era prática bastante comum em certos grupos judeus, e, de tempos em tempos, reaparece entre os cristãos, embora atualmente nenhum estudioso ou teólogo respeitável leve tal prática a sério.
Alegoria?
Na época de Jesus, Filo de Alexandria (falecido em 50 d.C.) desenvolveu a teoria que o Antigo Testamento era em grande parte uma alegoria de coisas divinas. Alegoria é uma forma literária na qual uma coisa representa outra, mesmo sem que haja ligação real entre as duas. Alegorização é o uso sistemático de alegoria como forma de interpretar um texto.
Ela se tornou popular como forma de interpretar o Cântico dos Cânticos, que muitos crentes viam como ilustração do relacionamento entre Cristo e sua noiva, a igreja, ou entre Cristo e o crente individual.
Como método de interpretação, a alegorização entrou na igreja cristã por intermédio de Clemente de Alexandria (falecido por volta de 215 d.C.), que seguiu a linha de Filo. Orígenes (cerca de 185-254 d.C.), que foi discípulo de Clemente, a transformou numa forma sistemática de interpretação bíblica.
Segundo Orígenes, havia três níveis de significado nas Escrituras: o literal, o moral e o espiritual. Estes correspondiam às três "partes" do ser humano: corpo, alma e espírito. Mais tarde, no século 4, o monge João Cassiano acrescentou outro sentido espiritual, o "anagógico", que é semelhante ao espiritual, mas focaliza a vida futura do cristão no céu.
A alegorização era muita popular na Idade Média, especialmente entre os monges, embora estudiosos sérios tenham feito o possível para mantê-la sob controle. Porém, ela parecia oferecer uma maneira muito atraente de interpretar o Antigo Testamento, que não precisava mais ser interpretado literalmente. Os acontecimentos que descreve -- a matança dos amalequitas, por exemplo -- não deviam ser entendidos como modelos para a conduta cristã, mas sim como sinais, indicando que devemos fazer morrer o pecado que se manifesta em nossa vida. As pessoas que adotavam esta abordagem geralmente acusavam os judeus de serem "literalistas" na sua leitura do Antigo Testamento, o que era considerado o motivo pelo qual não viam Jesus nele.
Na melhor das hipóteses, a alegorização foi um meio de encontrar referências ao Salvador em lugares que à primeira vista pareciam muito improváveis (como no exemplo de Cântico dos Cânticos), e de aplicar passagens bíblicas obscuras ao cotidiano.
Após a reforma, a alegorização cessou entre os intérpretes do mundo acadêmico, mas continuou sendo popular em outros lugares. Muitos hinos usam a peregrinação do povo de Israel no deserto para representar a vida cristã. Este é um dos temas alegóricos favoritos da antiguidade. Os chamados "negro spirituals", nos quais o rio Jordão representa a morte, a Terra prometida, o céu, e assim por diante, fazem uso frequente de alegorias. No século 19, principalmente, os pregadores gostavam muito de usar alegorias.
Níveis diferentes de significado
Em anos recentes, o crescente interesse dos estudiosos pelos gêneros literários usados na Bíblia levou muitas pessoas a perceber diferentes níveis de significado no texto, o que, por sua vez, está trazendo de volta a antiga interpretação espiritual.
Grande parte das interpretações alegóricas é grosseiras ou indubitavelmente errônea, mas pelo menos a alegorização mostra que uma passagem pode ter um significado mais profundo do que, à primeira vista, parece ter.
Algumas teorias modernas têm muito em comum com a alegorização e muitos esforços no sentido de tornar a Bíblia "relevante" para mulheres, para pessoas de países subdesenvolvidos e para outros assuntos contemporâneos precisam sem dúvida, ir além do que as palavras em si estão dizendo.
Aqueles que estudam a Bíblia não precisam escolher entre os dois tipos de interpretação: podem emprestar idéias de ambos. Mas é melhor dar preferência à interpretação histórico-literária direta.
Os cristãos acreditam que a aliança do Antigo Testamento entre Deus e seu povo se cumpre e, portanto, teu seu significado verdadeiro em Cristo. Isto deve ser levado em consideração quando tentamos aplicar uma passagem específica do Antigo Testamento aos dias atuais.
A vinda de Cristo alterou as condições em que um determinado texto do Antigo Testamento era aplicado originalmente? Neste caso, é provável que este texto deva ser usado de forma diferente hoje. Por exemplo, aquilo que o Antigo Testamento diz sobre os sacrifícios que, em tempos antigos, eram oferecidos no Templo (que não são mais realizados) pode esclarecer o significado da morte de Cristo na cruz, como sacrifício em nosso lugar.
Mesmo no Novo Testamento, é importante distinguir o que o texto ensina como princípio teológico permanente daquilo que ele simplesmente registra como fato histórico (as duas coisas não são idênticas). Por exemplo, os cristãos são chamados para seguir o exemplo - para imitar - tanto Cristo(Judeu) quanto o apóstolo Paulo (judeu). Isto significa compartilhar suas atitudes e convicções, e viver da forma que eles aprovariam - não se tornar carpinteiro ou fazedor de tendas!
A Bíblia é o livro mais importante na história da civilização ocidental. Ela foi acolhida em muitas culturas e comunidades, influenciando a fé e a prática. É crucial que seja lida de maneira que leve em conta os diversos tipos de literatura que ela contém.

Personagens em destaque para o retorno à interpretação histórico-literária da Bíblia foram Martinho Lutero(1483-1546) -Inventor da chamada "Reforma Protestante"  e João Calvino (1509-1564).
Juntamente com a interpretação histórico-literária, o uso espiritual e devocional da Bíblia teve continuidade, por exemplo, entre os pietista. O compositor de hinos Paul Gerhardt (foto abaixo à esquerda/1607-1676) valeu-se de figuras da Bíblia para escrever os hinos que foram usados nas cantadas de Bach e são cantados nas igrejas até hoje.
O desenvolvimento do método científico produziu várias abordagens de interpretação da Bíblia. Alguns, como Blaise Pascal (foto à direita/1623-1662), usaram as "provas" científicas de maneira positiva, mostrando, por exemplo, como as profecias do AT se cumpriram no NT. Outros cientistas, principalmente no século 19, usaram a abordagem "reducionista" (se a ciência demonstra que as origens humanas são evolutivas, o relato da Bíblia tem de estar errado). mais recentemente à medida que as pessoas começam a apreciar as diferentes formas de literatura na Bíblia, muitos passaram a considerar o relato bíblico e a posição científica complementares. São maneiras diferentes de ver a mesma coisa e responder perguntas diferentes. Não podemos esquecer que, infelizmente, há muitos erros de interpretação!
Paul Gerhardt

Calvino



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Filipenses 1:9-11

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